sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009


Chico Buarque: uma questão chave. (Sobre o texto de Ruy Castro)
Felipe Cordeiro

“Foi uma sutileza que Deus aprendesse grego quando quis se tornar escritor – e que não o aprendesse melhor”.
Friedrich Nietzsche in Além do Bem e do Mal – Prelúdio a uma Filosofia do Futuro



Um dia fui bobo e me perguntei: Por que não nasci em 1968? Um ano charmoso para a história do mundo todo, charmoso, sobretudo, porque os franceses são charmosos e 68 é um ano muito francês.
É, ainda, a fase heróica do movimento estudantil francês e que os estudantes, principalmente, paulistas e cariocas imitaram. Estamos falando da esquerda estudantil. Portanto 68 é um ano de muitas bandeiras e muitas “atitudes”. Só pra lembrar que os partidos de esquerda no Brasil, entre eles o próprio PT em outras épocas (e hoje o Pstu e Psol), usaram e ainda usam a mesma maneira sintética, reducionista e de rápido entendimento - para criticar o Capitalismo - que os estudantes da França sessentista, a saber, FORA “alguma coisa”!.
Chico Buarque chegou a mim aos 6 anos (me lembro de cada momento) de maneira imprevista, através da música Construção. Para mim, não há nada parecido com essa música (a composição melódica e poética no arranjo Genial) na história da música brasileira, de tudo que já ouvi, certamente essa música (e esse disco por inteiro) foi aquilo que mais me impressionou em matéria de genialidade musical (música popular) no Brasil até hoje. Quando escutei essa música era 1990. O muro de Berlim tinha sido derrubado há pouco tempo (não tenho memória real desse acontecimento), mas me lembro muito bem do Lula (com um aspecto sujo, meu pai votou nele) e do Collor com sua boçalidade estonteante. Quero dizer com isso, que não fazia a menor idéia do que era a Ditadura Militar, quem era Marx e a Alemanha Oriental. Ainda assim, aquele disco me tocou de maneira definitiva, como um destino.
Quero ainda dizer, que todo grande artista é sempre maior que o seu tempo, isso quer dizer que usa o tempo para impor sua qualidade de percepção do mundo. Um professor de História que contextualiza, de maneira lógica, músicas do Chico Buarque no período da Ditadura Militar no Brasil é óbvio que não sabe escutar música. É tão óbvio que não vou estender essa questão, não me interessa desenvolver obviedades. Mas o fato é que existe uma espécie de “chiquismo” tão idiota quanto todo outro “ismo”, que como bem disse Ruy Castro (neste ponto concordo com ele), tentou usar Chico Buarque como bandeira para certas coisas. A bandeira que mais me incomoda, e que Ruy parece hastear é a que o próprio Chico Buarque tem mais culpa, isto é, a que diz que a música (popular) camerística, harmonicamente equilibrada e nacionalista na poética é mais verdadeira, bela e genial forma de se fazer Música Popular no Brasil. Eis um engano que nosso Mestre do cancioneiro deixa subentendido, ainda que eu não tenha realmente como afirmar isso. Sei que seus discípulos, os “chiquistas”, pensam assim.
Arte é forma, mas não “pura formalidade”, pois designa algo exterior ao seu material. A única arte puramente formal é a arte musical. A música, diferente das outras artes, é só seu “material” sonoro: melodia, harmonia, timbre, ritmo, silêncio, duração. As artes plásticas, a literatura, a Filosofia (para alguns ela é uma arte), o Cinema (para alguns ele é uma arte), o teatro, a arquitetura, trabalham sempre com conceitos. Neste sentido não são artes puramente formais. A música popular brasileira não é só música, nem só literatura, mas uma síntese que se formou e se definiu historicamente. Quando falamos de música popular no Brasil estamos falando de uma maneira de expressão artística elaboradíssima, que tem uma Historicidade relativamente madura, tem, ainda, como marca a constante retomada de caminhos longínquos; tentativas sucessivas de elaborações de novos caminhos; mas que se caracteriza fundamentalmente por uma idéia, a idéia de contradição. Posto que da contradição chega-se a novas sínteses e formas estéticas. Enquanto que a idéia de Tradição se marca por um excesso de memorialismo, e repetição do mesmo, ainda que o mesmo seja Belo. Portanto uma “falsa síntese” já que a síntese deveria ser uma qualidade de percepção do mundo. Se esta qualidade já existe, isto é, já foi feita por alguém, seria quase que desnecessário impô-la novamente.
Mas pra não perder o fio da meada, quero com tudo isso, dizer que Chico Buarque foi um sujeito engajado no seu tempo, hoje o é de maneira mais tímida. Foi ao combate nas questões políticas e estéticas. Chico é um homem de Combate, ainda que hoje, em dias mais democráticos e com o seu presidente do coração eleito, fale pouco. Talvez por ser otimista com os tempos atuais (não acredito nisso), talvez pelos quase 70 anos e todo mundo, principalmente um gênio como ele, tem o direito de querer viver sem maiores batalhas.
Hoje percebo que nasci na época certa. Depois dos gregos da música popular brasileira. Chico é um deles. Talvez ele seja Aristóteles, o mais aparentemente lógico, mais “enxuto” na forma, mais Histórico. É bom rever os gregos, sem afetações políticas (de conteúdo esquerdista ou nacionalista), um mal tremendo pra toda a análise. O nacionalismo é uma ideologia de fracos. Toda nação é uma invenção. A única coisa que é fundamental na música popular brasileira é o princípio da Contradição, exatamente o oposto aquele da fórmula aristotélica, a saber, o princípio da não-contradição, onde algo não pode ser e não-ser ao mesmo tempo.

Um comentário:

RicardoFerro disse...

Sei que vai ser uma merda comentar primeiro aqui, mas é que sou recém-chegado... e o nome do blog me chamou a atenção... quer dizer então que o nome é "Número Vivo"?

Abraço, rapaz! Vou ler agora tudinho, com calma!